O Julgamento de Paris
A degustação que revolucionou o mundo dos vinhos.
Durante a maior parte do século 20, os vinhos da França eram considerados os melhores vinhos do mundo. O vinhos franceses eram os únicos considerados digno de veneração.
A degustação de vinhos do Julgamento de Paris de 1976 mudou tudo isso. De uma só vez, dois vinhos da Califórnia superaram o melhor que a França tinha a oferecer, e as consequências dessa degustação ainda podem ser notadas até hoje. O Julgamento de Paris mudou a forma como as vinícolas do Novo Mundo se viam e anunciou o crescimento do atual mercado global de vinhos. É um evento com o qual todo amante de vinho, mas principalmente aqueles que favorecem os vinhos californianos, devem estar familiarizados.
A degustação de Paris foi organizada por Steven Spurrier, um comerciante de vinhos inglês apaixonado por tudo que é francês. Sua loja de vinhos em Paris, Les Caves de la Madeleine, era famosa não apenas por seus vinhos de alta qualidade, mas também por l’Academie du Vin, uma escola de vinhos que Spurrier começou em Paris em 1973 e hoje tem filiais em todo o mundo.
A ideia da degustação de Paris não partiu de Spurrier, mas de sua sócia, Patricia Gallagher. Norte americana, Gallagher sabia que havia vinhos muito bons saindo da Califórnia.
Ela achou que organizar uma degustação de vinhos da Califórnia e da França em homenagem à Revolução Americana ajudaria a aumentar a conscientização sobre os vinhos americanos, ao mesmo tempo em que homenageia a história da cooperação entre os dois países.
Embora Spurrier e Gallagher tenham provado os vinhos durante a degustação às cegas, suas pontuações não contaram. Em vez disso, eles trouxeram nove juízes, muitos dos quais eram figuras conhecidas do vinho francês.
Além dos juízes, havia apenas um jornalista presente, George Taber da TIME. Taber escreveu a história original sobre a degustação, bem como um livro subsequente sobre o assunto: Julgamento de Paris: Califórnia vs. França e a histórica degustação de Paris de 1976, que revolucionou o mundo do vinho.
Na época, nenhum dos jornalistas convidados aceitou o convite para a cobertura da degustação, apenas George Taber acabou comparecendo, por não estar fazendo nada. Eles acreditavam que nesse “julgamento” teríamos uma conclusão óbvia, com os vinhos franceses se sobressaindo perante os americanos.
Os vinhos que Spurrier selecionou para a degustação não eram brincadeira, se tratavam dos melhores vinhos franceses na época, das principais regiões produtoras, Borgonha e Bordeaux. Ele escolheu vinhos franceses que ele pensou que ofuscariam facilmente a competição do Novo Mundo. Afinal, ele era um comerciante de vinhos francês, sem planos de começar a importar vinho americano.
Os vinhos californianos, vieram de vinícolas iniciadas ou reabertas nos anos 60 e início dos anos 70, por pessoas que escolheram a vinificação como sua segunda ou terceira carreira. Todos eram típicos da “nova era” do vinho californiano: pequenas operações focadas em fazer vinho de alta qualidade, em vez do vinho de jarro produzido em massa que era tão comum antes. Sem séculos de tradição para se apoiar, esses vinicultores faziam experiências constantemente para encontrar as melhores uvas e métodos de vinificação para seus terrenos específicos.
Os resultados da degustação às cegas chocaram não apenas os participantes, mas também os Estados Unidos e, por fim, a França. Ninguém – literalmente ninguém – esperava que os vinhos californianos sequer se comparassem aos franceses, muito menos ganhar as categorias tinto e branco.
Para a degustação de vinho branco, três dos quatro melhores vinhos eram californianos, não franceses, com Chateau Montelena ganhando com folga: 132 pontos no total, quase dez pontos à frente do segundo colocado Meursault Charmes, que recebeu 126,5 pontos.
Para a prova de vinhos tintos, as pontuações ficaram muito mais próximas do que com os vinhos brancos. Mas isso não mudou o fato de que um vinho californiano venceu novamente, batendo alguns dos melhores vinhos de Bordeaux. Foi o Stag’s Leap Cabernet Sauvignon que ganhou o dia.
No aniversário de 30 anos do Julgamento de Paris, Spurrier decidiu realizar outra degustação. No dia 24 de maio de 2006, jurados europeus e americanos, simultaneamente em Napa e em Londres, degustaram exatamente os mesmos vinhos de 30 anos antes. O resultado foi a vitória ainda maior da Califórnia: os cinco vinhos mais bem pontuados eram de Napa. O vencedor foi o Ridge Monte Bello, que havia ficado em quinto lugar em 1976. Stag’s Leap, o vencedor da primeira degustação, ficou em segundo. Os franceses ficaram da quinta à nona colocação e, em décimo, um californiano. Os vinhos do Napa conseguiram passar pelo teste do tempo.
Em 2008, para confirmar ainda mais esse fato, foi lançando o filme “Bottle Shock” (o Julgamento de Paris, em português) mostrando de maneira bem humorada, como foi feita essa degustação.
O julgamento também foi uma indicação de como o vinho seria feito e qual seria o seu sabor nos anos que viriam. O mundo do vinho, depende fortemente das tradições francesas, como o uso de barris de carvalho francês para o envelhecimento, enquanto usam tecnologia e pesquisa como forma de desenvolvimento.
A degustação do Julgamento de Paris foi um significante evento de que o mundo estava mudando na forma como faziam e consumiam vinho. Quer você concorde ou discorde das pontuações dos jurados, foi o momento em que os amantes do vinho perceberam que poderiam encontrar grandes vinhos de todo o mundo. E esse foi o Julgamento de Paris.